Um retrato geral de pessoas normalmente jovens que partem ao encontro dos Medos e que arriscam muitas vezes a vida para estarem cara a cara com eles com o intuito de lhes pedirem… Um «autógrafo» (!) – uma assinatura num papel que abre a porta a uma relação de proximidade única entre pessoas e Medos!
Há quem os chame destemidos,
corajosos, audazes, geniais; há também quem ache que são idiotas, líricos,
loucos, suicidas – aliás, existem mesmo pessoas que os elogiam e os criticam
assim ao mesmo tempo! Mas uma coisa é certa: é graças ao trabalho basicamente
carola, mas bastante exigente dos caçadores de Medos que muito do que se sabe
atualmente sobre essas criaturas está longe de voltar a correr o risco de cair
no completo esquecimento e está também em constante atualização.
Introdução histórica à caça aos Medos
Como já dissemos
anteriormente, muito do que se sabe atualmente sobre os Medos resultou das
interações que a Humanidade teve com eles ao longo dos tempos: a maior parte
dessas interações deram-se quando os Medos se alimentaram ou tentaram alimentar-se
através das pessoas às quais apareciam ou daquilo que elas produziam – isto se
estas não batessem a bota por causa disso, claro! –,
mas algumas deram-se porque muitos foram propositadamente ao encontro das
criaturas em causa. Grande parte dos encontros propositados por pessoas foram
de padres exorcistas ao expulsarem Medos de sítios onde causavam transtornos. Sim,
é possível praticar exorcismo contra Medos; porém, trata-se de um exorcismo
mais difícil do que aquele praticado contra espíritos comuns, uma vez que se
usam procedimentos diferentes e mais elaborados; além disso, um Medo
esconjurado de um sítio não volta para o outro mundo, mas aparece noutra área,
aparentemente sob ordens da entidade (a tal misteriosa entidade sobrenatural
sobre a qual os Medos estão relutantes em falar, lembram-se?!). Esses
procedimentos envolvem o conhecimento acerca dos Medos anteriormente adquirido,
conhecimento esse transmitido para a sabedoria popular. Outras interações com
Medos por iniciativa humana foram de pessoas cuja intenções eram capturar por
menos partes deles (ex.: a gema vermelha e a embiga de ouro que,
respetivamente, a Sombreeira e a Marwxúria possuem nos seus abdómens), muitas
vezes empurradas pela carestia de necessidades básicas, algo que acabava
frequentemente mal, mas não para os Medos – mesmo o Melrusquatro, tido como o
Medo mais fraco e mais amedrontado pelos vivos, bate com mais força que uma
pessoa adulta saudável média e defende-se agressivamente quando não pode fugir,
sem contar que há Medos que atacam primeiro e perguntam depois! Os que se
atreviam a empreender tais ações tinham então muito que contar… Se não
deixassem lá a pele, claro! E havia também interações com Medos propositadas
cujos motivos eram outros, entre os quais o suicídio!!
Porém, as
relações de proximidade entre as pessoas e os Medos, que, apesar de não serem
propriamente pacíficas, permitiam às primeiras aprenderem sobre os segundos, mudaram
drasticamente nas últimas décadas. A sociedade foi mudando ao nível das
infra-estruturas e dos serviços, o que permitiu a melhoria gradual das
condições de vida das pessoas que podiam ter problemas com Medos – por ex., era
cada vez menos necessário tentar obter a gema da Sombreeira ou a embiga da
Marwxúria para ganhar uns cobres em relação ao (pouco)
que se tinha, era cada vez menor a probabilidade
de se cair no logro do Galiforniano devido à (a partir daí decrescente) atenção
cobiçosa que um galo morto despertava nos historicamente lembrados períodos
anteriores de escassez alimentar, e era cada vez mais pequena a dependência da
criação de gado que fazia com que se tivesse de guardá-lo à meia-noite dos
ataques aéreos do Lupicóptero –; porém, isso não evitou que muitas das áreas
onde aparecem os Medos começassem a ficar desertificadas devido ao êxodo rural
e à emigração, concentrando-se a população humana cada vez mais nos centros
urbanos; assim, o afastamento das pessoas ao campo, onde se situam grande parte
das áreas de aparição dos Medos, juntamente com um maior acesso a uma cultura
de massas radicalmente diferente da cultura tradicional e mais vistosa do que
essa fizeram com que as criaturas em causa ficassem cada vez mais fadadas aos
livros de lendas do antigamente e a uma memória popular que ia morrendo juntamente
com as pessoas que envelheciam sem que poucos ou nenhuns ouvissem o que tinham
para contar acerca dos Medos, mesmo de experiências em 1º mão com eles. Esse período
é conhecido como os Anos Negros dos Medos: o que se conhecia sobre eles corria
o risco de desaparecer para sempre, e mesmo os próprios Medos tiveram de dar no
duro para que não sumissem deste mundo – menos pessoas a frequentarem as suas
áreas de aparições significam menos alimento disponível, logo, maior o risco de
voltarem para o outro mundo! Ao que se sabe, houve mesmo Medos cuja existência
se findou por não conseguirem alimentar-se o suficiente para se manterem entre
nós!!
Mas então como é
que surgiram os caçadores de Medos? Porque é que os Medos e o que se sabe sobre
eles estão a voltar em força, e pelos vistos para ficarem, felizmente? Bem, a
causa disso foi a mesma causa que disponibilizou a cultura de massas que quase
extirpou os Medos da memória coletiva: a comunicação de massas – mais
concretamente a Internet! Não sabemos ao certo como é que isto começou, mas
pensa-se que foi há cerca de 15 anos, quando na altura começaram a surgir os
primeiros sites, no início pouco conhecidos, com conteúdo relacionado aos Medos
que estava disponibilizado nos poucos livros sobre o assunto publicados até
essa altura e nas tradições orais que persistiam em mentes de avançada idade,
mas ainda lúcidas, principalmente nas dos avós dos donos dos tais espaços
online. O que começou com um punhado de sites obscuros foi crescendo: esses
mesmos sites foram tendo mais visualizações por parte de um público cada vez mais
interessado, foram aparecendo outros sites que competiam pelo mesmo público,
fóruns inteiros e tópicos de fóruns acerca dos Medos surgiam com cada vez mais
participação, e então foram-se desenvolvendo as redes sociais, que deram um
aumento à já crescente popularidade dos Medos através de publicações escritas e
partilhadas, imagens, «Gostos» e comentários relativos às ditas criaturas! É
por isso que os Medos não só voltaram ao conhecimento geral das pessoas, lugar
onde merecem estar e para o qual vieram para ficar, como também se tornaram
numa moda que está longe de ser passageira! É nesse contexto que, entre aqueles
cujo fascínio pelas criaturas em causa foi despertado pelas novas tecnologias, surgem
os caçadores de Medos, com um fascínio que os faz partir em busca deles… E pelo
qual muitos desses caçadores perderam a vida!!
A caça aos Medos
é uma atividade recente, tendo surgido há poucos anos; porém, trata-se de uma
atividade que está a crescer a olhos vistos, mesmo sendo basicamente amadora. A
caracterização sociológica do típico caçador de Medos pode explicar esse
crescimento: é um adulto jovem que nasceu e sempre viveu em áreas urbanas, com
pelo menos o Ensino Secundário concluído, ligado às novas tecnologias que lhe
permitiram descobrir essas criaturas e aprender mais acerca delas ao longo da
sua juventude, com pouca ou nenhuma ligação a um mundo rural que idealizam como
natural, quase intocável, por descobrir e um escape para uma vida citadina rotineiramente
sedentária, e com um desejo de emoções com sabor a risco pessoal e de
descoberta das próprias raízes através de um mundo sobrenatural que lhes desperta
a curiosidade. No fundo, um caçador de Medos é um aventureiro pela opção de provar
a sua ousadia ao contactar em 1º mão com criaturas de um passado que ainda está
presente, um idealista pela preservação cultural num mundo em rápida mudança
através da observação no terreno daquilo que procura… Só que essa opção tem de
ser ponderada e esse idealismo não pode ser desmedido, sob pena de pagar com a própria
saúde, física e/ou mental, ou mesmo com a própria vida – os Medos, mesmo os
mais pacíficos, devem ser lidados de perto com cuidado e respeitinho!!
As atividades de um caçador de Medos
A caça aos Medos
consiste basicamente em ir à procura deles para que façam a sua assinatura num
papel – em suma, trata-se de chegar junto das tais
criaturas e pedir-lhes uma espécie de autógrafo! Acreditem, que é verdade! E
tão ou mais inacreditável ainda é os Medos saberem não só escrever o seu nome
(atual), como também saberem ler e escrever com as letras do alfabeto latino na
perfeição, quando a maior parte deles eram em vida de períodos, localizações
geográficas e/ou condições sociais em que o analfabetismo absoluto pelo menos
em relação a esse sistema de escrita alfabética era a regra e não a exceção (foi
a entidade que alfabetizou quem não sabia ler e escrever daquela maneira? Pena
é os Medos recusarem-se afincadamente a dizer como é que adquiriram o corpo e
as capacidades que hoje têm, pelo que ainda não há respostas para essa e outras
questões)!! Os Medos podem escrever ao pegar num objeto de escrita manual com 1
das suas mãos, 1 das suas patas dianteiras, 1 das suas asas, a sua cauda ou a
sua boca, consoante o que lhes der mais jeito (ex.: como um arbusto lhe cobre
quase todo o corpo, incluindo as 4 patas, ao ponto de não o poder usar para
além da locomoção, o Akihagato usa a cauda dele para pegar ou mexer nas coisas,
e o Formigueister manobra os objetos com a sua boca, uma vez que não tem
membros nem cauda). O Medo que assinar o papel que um caçador traga consigo
para o efeito tornar-se-á leal para o dono desse papel e pode ser-lhe útil em
várias tarefas – ex. mais notórios: na medida do possível, o Medo que fez a
assinatura acompanha e ajuda o caçador que possui o papel que assinou na
procura de Medos que ainda não o fizeram e fornece-lhe mais informações acerca
dele e do tipo de criaturas a que pertence quando solicitado.
Mas se pensam que
é fácil obter a assinatura de um Medo, estão muito enganados! Os Medos não
assinam nada assim sem mais nem menos, pois acham que quem quer alguma coisa
deles deve ir ter às áreas onde aparecem, como é óbvio, e provar que é digno de
ter uma relação de confiança com eles! E olhem que os Medos sabem bem quem
precisa realmente de ajuda no que podem fazer e quem tem segundas intenções com
eles (por ex., o Mestrespírito e a Motodelouca não hesitam em dar a mão a quem
tem problemas, respetivamente, na água e nas estradas terrestres, mas
recusam-se a ajudar quem se puser propositadamente em apuros para que eles se
aproximem e assinem o papel após o auxílio)! Para começar, muitos Medos são
agressivos e atacam à vista, em especial aqueles que principalmente se
alimentam da energia que sugam, da dor física que provocam e da carne e outros
derivados do corpo das pessoas de qualquer idade que atacam, tanto para se
alimentarem como para mostrarem que não querem ser abordados por qualquer
motivo; há Medos que são esquivos e saem de cena mal se obtenham ou tentem
obter o seu tipo de alimentação primária, ou simplesmente evitam quem os
procura; além disso, a caça aos Medos é uma atividade muitas vezes solitária – há
criaturas dessas que aparecem a 2 ou 3 pessoas de cada vez sem ser para as
ajudar, mas a maior parte delas só aparece a quem esteja desacompanhado de
outras pessoas.
Porém, é aqui que entram em
cena os Medos que já deixaram a sua assinatura no papel: se estiverem
disponíveis, podem acompanhar quem possui o papel para vencerem em combate e/ou
evitarem que fujam os congéneres deles cujos «autógrafos» ainda não foram obtidos.
O caçador só pode ser acompanhado por 1 Medo em cada caçada, e precisa de escolhê-lo
muito bem com antecedência: é necessário, repetimos, que os Medos não estejam
indisponíveis quando são precisos, os dados de colaboração deles (assunto que será
explicado mais tarde) têm de ser os ideais, e convém que quem acompanhe tenha
vantagem de elemento sobre o Medo cuja assinatura se queira ver no papel. Além
disso, pode-se construir uma relação de confiança entre um caçador e um Medo
que já assinou o seu papel – quanto maior for essa relação, mais disposto está
o Medo a seguir e ajudar o caçador. 1 das formas de construir uma confiança
dessas é o caçador ir à área de aparição do Medo para alimentá-lo com os tipos
de alimentação alternativa dele. Porém, construir uma relação de confiança com
Medos não é tarefa fácil.Aliás, a caça aos Medos como um todo é bastante exigente e difícil: custa muito dinheiro a uma geração, à qual pertence a maior parte dos caçadores de Medos, que vive tempos de incerteza financeira (repetimos que não se ganha dinheiro com isso, ou pelo menos trata-se de uma atividade em que não se ganha retorno financeiro consistente [de forma direta, pois há caçadores que têm ganho dinheiro considerável através de palestras e publicações de livros sobre aquilo a que se dedicam, mas esses contam-se pelos dedos de 1 mão]), o planeamento e a organização do que se deve fazer são necessários, requer paciência, é fisicamente extenuante, e pode ser perigosa – muitos caçadores perderam a vida às mãos dos Medos pelos quais procuravam ou devido a outras causas que aconteceram nas áreas de aparição deles. E fiquem a saber que, por causa disso, a maior parte de quem caça Medos há pelo menos alguns anos só recolheu as assinaturas de cerca de 20 Medos; o número de caçadores de Medos atuais diminui quanto maior for o número de Medos que já assinaram o papel deles, ao ponto que só há o registo de 1 caçador que tem os «autógrafos» de todos os Medos existentes e que se conta pelos dedos de 1 mão quem tem o papel assinado por mais de 85 % das criaturas em causa! Compreensivelmente, apesar da caça aos Medos estar a crescer claramente, tal como já dissemos aqui, quem se dedica a isso ainda é olhado de soslaio por muita gente, incluindo outras pessoas interessadas nos Medos, e alvo de duras críticas pelo que faz (verdade seja dita, algumas são fundamentadas!). Em suma, é uma atividade de lazer que não é uma brincadeira (é por causa de muitos não compreenderem isso que dizemos, sem problema algum, que há mais pessoas dedicadas a caçar Medos do que devia haver – daí algumas das críticas dirigidas a essas pessoas serem fundamentadas!). É uma forma desafiante de conhecer o mundo que nos rodeia, em especial os Medos e a cultura que os envolve.
No próximo artigo iremos dizer quais os procedimentos que um caçador de Medos deve tomar para lidar de perto com Medos de forma segura e eficaz.
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